Dave Grohl
Dave Grohl está na boa. Aliás, está na ótima. Amarradão, sob o sol do verão americano, o ex-baterista do Nirvana e líder do Foo Fighters, agora sem o cavanhaque que adotou no começo do ano, se refresca num bar de praia, na Carolina do Norte, onde aproveita uns dias de férias antes de embarcar para a Europa. Falando pelo telefone, ele confessa que acaba de voltar do mar, onde "pegava umas ondinhas". "Desculpa, você não pode falar um pouco mais alto? Tá um pouco confuso aqui..." diz o novo solteiro da praça - divorciou-se no final do ano passado. Tudo bem, Dave, dá pra perceber a zoeira pelo lado de cá da linha. O negócio parece estar bom aí... "Quer saber? Estou me divertindo muito como solteiro.. Você entende, né?" Perfeitamente.
Vamos aos fatos: The Colour And The Shape, o segundo disco dos Foo Fighters, vem tendo um desempenho ainda melhor do que o álbum de estréia, lançado em 1995, e Dave deixou definitivamente de ser "aquele cara talentoso que tocava bateria no Nirvana" e passa a figurar como uma das grandes cabeças do novo rock americano. O maior responsável por isso são suas músicas simples, pesadas e altamente melódicas. Do jeitinho, aliás, das canções inesquecíveis compostas por Kurt Cobain. "Uma das coisas que fizeram com que eu, Krist e Kurt nos déssemos tão bem é que gostávamos tanto de punk rock como de música pop. Ouvíamos Black Fla e ao mesmo tempo Beatles, Abba, The Smithereens... Tem outra coisa: hoje eu toco guitarra, mas gostaria mesmo de estar tocando bateria. Então toco bateria na guitarra! Por isso é que o Foo Fighter é tão melódico e porrada", explica. Mas durante o tempo covivendo com Kurt, não deu pra aprender nada? "Numa época, dividimos apartamente e quando sentávamos para tocar guitarra era muito enriquecedor... O cara era foda, né? Eu aprendi muito com ele... Foi o Kurt, aliás, quem me ensinou a cozinhar peixe. Ele era ótimo na cozinha!", conta, aos risos.
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Rindo ainda mais, lembra de quando, moleque, roubou um violão com cordas de nylon do pai e, a partir daí, passou a fazer um barulho dos diabos - até que a mãe, não agentando o martírio, mandou o Davinho maleta tomar aulas de guitarra. Foi aí que tudo começou. "Desde então não parei mais de compor. Cara, eu amo música, sou absolutamente obcecado pelo negócio...", diz, empolgado. Ok, mas por que nunca incluiu nenhuma composição sua no repertório do Nirvana? "É, trabalhamos meio juntos em 'Polly', mas foi só. Nós já tinhamos músicas demais... Como Kurt era genial, usávamos as canções dele. |
Além do mais, eu era muito tímido, tinha medo de mostrar as coisas que escrevia. Só um pouco antes dele morrer é que tomei coragem e abri o jogo. Kurt gostou especialmente de duas músicas e iríamos incluí-las num futuro disco do Nirvana. Elas eram 'Exhausted' e 'Alone+Easy Target', que acabaram entrando no primeiro álbum do Foo Fighters."
Esse álbum, você sabe, era na verdade uma demo tape
inteiramente tocada por Dave e que acabou virando CD. "Na minha casa tinha um porão
onde montei um pequeno estúdio. Então, quando tinha alguma idéia, era só descer a
escada e registrá-la. No final de 1994, tinha 35 músicas prontas", conta orgulhoso.
Para Dave, o Foo Fighters é como se fosse um filho. "Eu me orgulho muito dessa
banda. É o bebezinho que eu não tive. Me envolvo com absolutamente tudo. Quero saber
para aonde vai, como vai..." Não é lindo? Só que depois de três anos direto,
vivendo em função da banda, Dave está precisando dar um tempo. A essa altura do
campeonato, depois da turnê europeia, que passou pela Inglaterra, Irlanda, Bélgica,
Holanda, Alemanha, Áustria e Hungria, o cara provavelmente está numa situação bem
parecida com a que vivia no momento desta entrevista, relax. "Preciso descansar e vou
dar uma parada de seis a oito meses na banda. Estamos direto na estrada desde janeiro de
1995, só paramos durante um mês e meio, entre o fim da turnê do primeiro disco e o
início das gravações de The Colour And The Shape. Tem mais: estou nessa história de
rock'n'roll desde os 17 anos. Agora estou com 28. Pô, são onze anos só pensando nisso.
Preciso ter um pouco de vida fora de bandas de rock", desabafa. É, faz sentido...
Mas que tipo de coisa você vai fazer? "Cara, tenho uma maneira de viver muito comum.
Gosto de sair com os amigos, fazer churrascos, aquelas mesmas coisas banais que todo mundo
faz. Não canso de dizer: sou um sujeito normal", insiste. É isso aí. Dave odeia -
reforçar não custa nada - esse negócio de idolatria e de ser tratado como popstar.
"Eu não acho que um pôster com a sua cara pregado na parede seja importante. Pô,
colocar um cara num pedestal só porque ele toca guitarra? Muitos deles são uns merdas,
não valem nada...", detona. O discurso violento é resquício da sua adolescência
punk. "Nessa época, eu ouvia punk rock e fazia uns bicos. Trabalhava numa pizzaria e
numa loja de móveis para poder ver os amigos tocarem na sexta-feira à noite",
conta.
Quando moleque, Dave era o diabo. "nasci hiperativo, vou fazer o
quê? Meus professores sempre chamavam a minha mãe na escola para reclamar sobre isso.
Diziam que eu era um aluno brilhante, mas poderia me sair ainda melhor se conseguisse
manter o rabo sentado na cadeira. De qualquer forma, até entrar no científico, tirava
notas bem altas, sabe? Aí, comecei a fumar maconha e não quis mais saber de porra
nenhuma", lembra. E agora, Dave? "Não, não fumo mais maconha e nem bebo. A
doideira da época do Nirvana foi o suficiente..." E a hiperatividade? "Ah,
continuo com muita energia. Não agento ficar sem fazer nada. Se estou em casa de bobeira,
vou lavar janela, molhar o jardim, qualquer coisa... Muitas vezes acabo com a guitarra na
mão, estudando, compondo..." revela. Isso explica alguns projetos paralelos, como a
banda Harlingtox AD, em que Dave toca baixo (!), e a autoria da trilha sonora do filme
Touch. "Fazer a música desse filme foi uma experiência divertidíssima! Numa trilha
sonora, você não precisa fazer pop ou rock, tem de criar qualquer tipo de música, tirar
sons, barulhos malucos... As possibilidades são infinitas. Se eu pudesse, ficaria uns
três anos só fazendo esse tipo de trabalho. Quero investir em mais uma trilha ano que
vem", diz, meio que querendo encerrar a entrevista. "Cara, não me leva a mal,
mas tenho de atender a um jornalista da Alemanha daqui a dois minutos", pede, depois
de mais ou menos 45 minutos de conversa. outra entrevista? Você não está de folga,
Dave? "É, o pessoal da gravadora sempre faz esse tipo de coisa. Mas tudo
bem..." Ok, última pergunta? Nas fotos mais recentes do Foo fighters, você e os
caras da banda estão sempre vestidos com roupas de costureiros famosos, como Armani ou
Givenchy. O que aconteceu com aquele garoto punk que gosta de Pixies e Hsker D?
"Ha-ha-ha... Boa pergunta... Fazemos fotos com esse tipo de roupas de sacanagem. É
bem divertido, sabe? Só isso. Não me transformei num modelo, não... Eu não quero que
pensem que estamos frescos assim. No palco, continuamos nos vestindo como
mendigos..." Esse é o Dave Grohl que a gente conhece...
Este texto foi retirado da revista Show Bizz 09\97